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O caso do Censo no total de deputados federais por estado

Atualizado: 17 de jul. de 2023

Humberto Dantas

Desde 1991 ouço dizer que terminado o Censo, naquele caso a edição de 1990, a distribuição de deputados federais pelo Brasil precisa ser alterada para respeitar a proporcionalidade populacional dos estados. Será mesmo que isso é tão urgente e relevante à luz de nossa realidade? Vamos pensar juntos.



O total estadual de deputados federais do Brasil respeita aspectos políticos, sendo possível dizer que o próprio volume de estados carrega consigo forte carga desta natureza. Tocantins é a unidade estadual mais jovem do país, nascida no bojo do processo constituinte. Recentemente, o Pará realizou plebiscito para se desmembrar em mais dois estados, ideia derrotada nas urnas em 2011. E se somarmos todos os projetos sonhados que tramitam ou gravitam pelo Congresso Nacional, nos aproximaríamos rapidamente de 40 estados! Assim, entenda: muitas destas decisões são políticas, ou seja, nem tudo é matemático e exato.



Reforça essa ideia o fato de que historicamente o mínimo de deputados por estado era diferente do que temos hoje. Na Constituição Federal de 1988, por exemplo, cujos parlamentares foram eleitos em 1986, São Paulo não tinha 70 representantes, e alguns anos antes disso, durante a ditadura, o mínimo por unidade era de quatro, e não de oito – tal total teria sido inchado exatamente para beneficiar a legitimidade “democrática” dos militares no poder. Ademais, dos estados que possuem tal mínimo (8), que equivalem a 1,5% dos 513 deputados federais, parte não tem isso em termos populacionais e está sobrerepresentado; e mesmo recebendo adição faz cerca de 35 anos, São Paulo está muito aquém dos mais de 100 deputados que deveria ter se tudo fosse exato.



A Ciência Política explica isso, e tal desproporção não é exclusividade do Brasil. O fenômeno chamado de “demos constraining” visa exatamente constranger proporções demográficas em situações, por exemplo, de distribuição exageradamente desigual de pessoas por estado dando sobrerepresentação aos pequenos e sub-representação aos grandes. Mais uma vez: o que explica isso são aspectos gerais de justiça e decisões políticas. Em resumo: defender acertos da distribuição de cadeiras por estado com base no Censo é, aparentemente, como querer deixar enfeites de pé sobre a estante depois de um terremoto, ou seja, pode ser apenas um mero detalhe ou um preciosismo exagerado de quem entende os motivos da desproporção geral, mas sonha em ajustar as proporções específicas. Possível? Sim. Necessário e urgente? Não.


Mas a despeito dessa posição de cunho mais pessoal, os resultados do Censo 2022, que não foi realizado em 2020 por questões associadas à pandemia, mais uma vez trouxe à tona a questão das cadeiras de deputados federais por estado. Ao todo, este ano, olhando o pleito de 2026, teríamos ajustes em 14 unidades federativas. Isso porque muitos dos estados que possuem o mínimo de oito já ficariam de fora das alterações por terem menos de 1,5% da população, e São Paulo, com 70, já atingiu o teto constitucional e não pode ficar além do limite que já possui. Com raras exceções a tais casos, sobra o resto e a reorganização de tais realidades. E será que isso vai ocorrer, de fato? Aqui entra algo subnacional que sempre levanto quando o assunto é este acerto censitário. Trata-se de algo que sempre passa desapercebido pelos analistas. Vamos lá.



O total de deputados ESTADUAIS por unidade federativa é igual ao triplo de deputados FEDERAIS de cada estado. Ou seja, um estado com oito federais terá uma Assembleia Legislativa com 24 deputados estaduais. Correto? Sim, mas São Paulo não tem 210 deputados estaduais, fruto dos seus 70 federais. Não mesmo. Tem toda a razão. O triplo é contado até o 12º deputado federal, ou seja, estados que possuem 12 parlamentares em Brasília, possuirão 36 parlamentares em seu legislativo estadual. A partir do 13º, o saldo é multiplicado por um. Em resumo, para o caso paulista: 12 x 3 = 36. Tiro estes 12 primeiros dos 70 e terei 58, valor que deve ser multiplicado por 1. Agora basta somar: 58 + 36. E chegarás matemática, exata e rigorosamente aos 94 deputados estaduais de São Paulo. Entendeu?



Pois bem. A convite da Folha de S. Paulo, o DIAP fez uma estimativa de quem perderia e quem ganharia deputados federais com o novo Censo. Sete estados perderiam federais e sete ganhariam. E como ficariam suas Assembleias? Essa pergunta é essencial, pensando que estamos debatendo algo que procura ser “justo” e evitar remendos. Ou seja: se mexermos na Câmara teremos que alterar as localidades. Correto? Sim, imagino eu.



Então vamos ao que existe de concreto. Estados como Rio de Janeiro (-4), Bahia (-2), Rio Grande do Sul (-2) e Pernambuco (-1) perderiam federais e, como possuem mais de 12 representantes em Brasília, em tese deixariam de ter igual número de deputados estaduais em suas assembleias. Já Alagoas (-1), Paraíba (-2) e Piauí (-2), possuem menos de 12 federais, ou seja: perderiam, respectivamente, três (AL) e seis (PB e PI) deputados estaduais cada um. Tudo bem? Difícil imaginar, sobretudo se a conta der negativa, ou seja, mantidos os 513 federais, mas reorganizando a conta da proporcionalidade na Câmara, o total de deputados estaduais pode cair. E você já viu político aceitar isso com naturalidade? Claro que a resposta pode ser: o STF mandou, e ninguém vai questionar. Mas perceba: Santa Catarina, Pará, Minas Gerais, Ceará e Goiás ganhariam federais, mas todos eles têm mais de 12 representantes em Brasília, ou seja, seus adicionais seriam multiplicados por 1 nas respectivas assembleias. As exceções aqui são: Amazonas, que ganharia dois federais, e, portanto, seis estaduais, e o Mato Grosso, com mais um federal e três estaduais. E agora? O saldo geral da conta com base na estimativa do Diap é 24 deputados estaduais a menos onde cai o total de federais, e 20 a mais onde eles aumentam, ou seja, de 1.059 cairíamos para 1.055 representantes nas assembleias de todo o Brasil. O número já foi pior, pois com base no censo de 2010 essa queda era de dez, como calculei à época para o Estadão. E agora? Para um povo afastado da política isso deve soar como música. Mas sério mesmo que precisamos pensar em organizar isso?


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