Eduardo Seino
Há quase 1 ano publicamos um texto[1] que tratou da importância da Lei Aldir Blanc (Lei Federal nº 14.017, de 29 de junho de 2020) para o setor artístico e cultural no contexto da grave crise sanitária trazida pela pandemia de COVID-19. Em síntese, esta Lei Federal direcionou recursos para socorrer os profissionais da cadeia produtiva da cultura por meio de: a) pagamento de auxílio emergencial diretamente aos profissionais; b) subsídio de custos fixos (aluguel, água, luz, internet, entre outros) de espaços culturais; c) financiamento de atividades culturais executadas online ou respeitando o distanciamento social, viabilizadas via editais.
A Lei Aldir Blanc exigiu agilidade dos governos estaduais e municipais para estruturarem uma sequência processual de implementação dos recursos, bem como capacidade de articulação entre os atores locais da cultura (profissionais da cultura, sociedade civil, conselhos municipais de cultura e gestores) para organizarem propostas conectadas com as demandas do setor, seja em âmbito estadual ou municipal.
A verdade é que especialmente os municípios nunca viram tanto recurso chegando em uma área tão pouco valorizada. O contexto criou expertise técnica sobre a operacionalização dos recursos dentro da administração pública, mobilizou os atores e movimentou o setor cultural. Uma oportunidade foi aberta para remodelar o fomento à cultura no país de forma mais efetiva, descentralizando a função de aplicar estes recursos para os estados e municípios.
Nesta linha, foi elaborado o Projeto de Lei nº 1.518/2021[2], que reeditou a Lei Aldir Blanc de 2020, prevendo o repasse de recursos da União para os estados, Distrito Federal e municípios, pelo período de cinco anos, com objetivos e diretrizes bastante semelhantes à Lei anterior. No entanto, no dia 05 de maio de 2022, o PL foi vetado integramente pela Presidência[3].
Embora tamanha falta de visão e desapreço pelo setor cultural fossem esperados vindos do atual governo, o fato é que o Projeto de Lei retorna ao Legislativo Federal e o veto presidencial deverá ser votado em breve pelo Congresso Nacional, em sessão conjunta, a ser agendada. O presidente do Senado Federal, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), declarou que o projeto ganhou força entre os parlamentares e, por isso, poderia existir uma tendência à derrubada do veto, que demanda maioria absoluta dos votos de Deputados e Senadores, isto é, 257 votos de deputados federais e 41 votos de senadores, contabilizados separadamente.
As eleições estão aí. Senadores, deputados federais e estaduais estão em pré-campanha, intensificando o diálogo com as suas bases eleitorais, sobretudo, com prefeitos. Não poderia existir momento melhor para a pressão social entrar em cena e garantir que o veto seja derrubado.
O que está em jogo não é nada trivial. Estamos falando da possibilidade de transformar o incentivo do Estado à produção cultural do nosso país, por meio: a) da viabilização de atividades culturais para a população, principalmente em pequenos municípios que não dispõem desta opção; b) da geração de renda aos profissionais envolvidos na cadeia produtiva da cultura e estímulo ao surgimento de novos talentos; c) fortalecimento da gestão democrática e participativa através das deliberações dos conselhos municipais/estaduais de cultura acerca da aplicação dos recursos; d) do desenvolvimento da economia local com mais recursos no município.
O Legislativo Federal acertou com a iniciativa de redirecionar o caminho do financiamento da cultura no Brasil. Esperamos que, a despeito da atual adversidade, recoloque-o no trilho uma vez mais.
[1] https://politica.estadao.com.br/blogs/legis-ativo/lei-aldir-blanc-do-pontual-ao-permanente-derrubaoveto/
Créditos da imagem: Prefeitura de Chã de Alegria
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